É provável que o leitor ou algum de seus conhecidos já tenha recebido pelas redes sociais (ou por e-mail) mensagens de texto, de vídeo e áudio contendo mirabolantes formulações que supostamente curam todo tipo de câncer, dicas “infalíveis” de dieta ou alertas contra supostos perigos de vacinar as crianças.
Uma análise mais cuidadosa do conteúdo desse material (assim como boa parte do que circula nessas redes sobre outros assuntos) mostra que as teses não param em pé. No caso da nutrição, sobra gente maldizendo o leite, mandando adotar o sal do Himalaia na dieta ou dizendo que adoçante é “câncer na certa” –como recebi recentemente.
A nutrição, como área de estudo, não nasceu ontem. E parece que as pessoas esquecem disso na hora de apertar o botão de compartilhar, ávidas para serem portadoras de uma novidade que seria deliberadamente escondida ou ignorada por especialistas.
Existem inúmeras discussões nutricionais relevantes –o açúcar parece ser mais vilão hoje do que era no passado; a gordura, por sua vez, tem tido parte de sua má reputação aliviada por novos estudos; alguns adoçantes, eventualmente, podem fazer uma pessoa ter mais fome. Como vale para quase tudo na ciência biomédica, as coisas não são preto no branco (vide nosso último post sobre suplementação de cálcio e vitamina D).
As consequências do consumo dos diversos nutrientes podem ser muito diferentes dependendo da condição clínica e do organismo de uma pessoa. E não é porque alguns têm alergia a leite de vaca que, de repente, o alimento passa a ser um vilão nutricional (já falamos sobre o leite aqui no blog Cadê a Cura?, em outra ocasião).
Quando explodiram os casos de recém-nascidos com microcefalia decorrentes da infecção materna pelo vírus da zika, logo ganhou as telas de celulares um vídeo de um sujeito afirmando que o surto teria sido causado pela aplicação de vacinas provenientes de um lote estragado. Bobagem, mais uma vez.
Imagine um paciente que recebeu uma mensagem dizendo que espinheira-santa e graviola curam câncer de intestino e que decide largar o tratamento convencional –que, em muitos casos, cura–, passando a tomar chazinho –sobre o qual não há qualquer evidência científica sólida. O maior prejudicado aí não é o laboratório farmacêutico, que deixou de lucrar com suas drogas, e sim o próprio paciente, que provavelmente terá sua vida abreviada.
O risco de tomar uma decisão baseada na “sabedoria” das redes sociais é enorme. As consequências de mudar a esmo a maneira de se tratar diabetes –abandonando o adoçante, supostamente cancerígeno, em favor de algum tipo de açúcar– ou de deixar de vacinar uma criança contra rubéola –por um receio infundado de “metais pesados” no vidrinho– podem ser terríveis.
Há, sim, benefícios na difusão boca a boca (ou celular a celular) de informações de saúde, como na ameaça do surto de febre amarela, quando munícipes de São Paulo, por exemplo, puderam trocar mensagens sobre quais postos tinham mais ou menos fila de interessados na vacinação. Em casos assim, as informações são verificáveis, de acesso público –não há tanto espaço para invencionices (apesar de haver gente tentando matar macacos, que, assim como humanos, são vítimas da doença).
A melhor maneira de se prevenir contra boatos, farsas e inverdades é buscar, consumir e repercutir conteúdo produzido por fontes que tenham uma boa reputação –vale a pena gastar um tempinho buscando artigos científicos (que nem sempre são consensuais ou obrigatoriamente verdadeiros, vale lembrar) ou conteúdo produzido por quem faz jornalismo profissional.
Uma consulta cara a cara com um profissional capacitado e que tenha conhecimento e tempo para analisar todas as variáveis relevantes e ajudar o paciente a tomar a melhor decisão é insubstituível. Mas, de novo, cuidado: existe um número não desprezível de picaretas por aí –até vacina homeopática contra febre amarela já inventaram.
Referência: Folha de S. Paulo
Fonte: Anahp
0 comentários